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20 de Abril de 2024

Escola gratuita é mais eficaz contra desigualdade que Bolsa Família

Ensino público injeta R$ 106 por aluno no orçamento das famílias, aponta estudo.

há 7 anos


Em um dos países mais desiguais do mundo, estudo inédito do economista Sergei Soares, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que a educação pública universal é ainda mais eficiente do que se imaginava para distribuir melhor a renda no Brasil. Além do efeito a longo prazo de melhorar a distribuição de renda no mercado de trabalho, aumentando o capital humano e encurtando a distância salarial, a escola pública gratuita representa injeção direta de recursos de R$ 106 por aluno no orçamento das famílias, nas contas do economista. Como a educação básica (fundamental e média) é quase totalmente pública, acaba favorecendo as famílias que estão na base da pirâmide de renda.

— É a política mais importante para reduzir a desigualdade. Mesmo com todos os problemas de qualidade da educação pública, ela é altamente pró-pobre.

Soares imputou um valor para educação pública. Ou seja, mediu o quanto a educação gratuita vale em reais. Assim, levando em conta este valor, o Índice de Gini, que mede o grau de desigualdade de uma sociedade e quanto mais próximo de um, maior a concentração de renda, cairia 6,5%.

Em outras palavras: se nas contas do Gini fosse atribuído o valor monetário da educação pública, o índice cairia de 0,592 para 0,553. É uma queda equivalente à metade do recuo na desigualdade registrada no país desde 2001. Foi nesse período que a distribuição de renda no Brasil começou a melhorar. O programa Bolsa Família, política focalizada nos mais pobres, respondeu por um quarto da queda, diz Soares.

“Se o ensino primário fosse monetizado, seria mais progressivo (mais distributivo) do que qualquer fonte de renda. O ensino público pode se constituir em uma contribuição relevante do Estado para as famílias nos três ou quatro quintos inferiores da distribuição de renda”, afirma o estudo.

O economista usou as notas da Prova Brasil e do Enem para atribuir valor à escola pública. Encontrou alunos da rede pública que tinham as mesmas notas de alunos da rede privada e verificou quanto era a mensalidade nas escolas particulares correspondentes às notas dos alunos.

— A educação pública é universal, mas é mais dirigida às crianças que estão avassaladoramente entre os mais pobres. O ensino privado é um fardo financeiro substantivo apenas para os que se encontram nos dois quintos superiores da distribuição de renda, principalmente o quinto superior — diz Soares.

O economista Naércio Menezes Filho, professor do Insper, estuda esse papel da educação na melhoria da distribuição de renda. Conforme a instrução avança, diminui a diferença salarial pela formação, e a desigualdade cai. Nas suas pesquisas, constatou que, em 1995, quem tinha cursado a primeira fase do fundamental ganhava 53% a mais do que quem era analfabeto. Em 2012, essa distância caíra para 27,7%. Em 2015, já estava em 19%, com o aumento da população mais escolarizada no mercado:

— Quando o diferencial de salário é alto para aquela escolaridade, a população enxerga isso e vai estudando mais. Parte importante da queda da desigualdade tem a ver com a redução do diferencial de salário de ensino médio.

Quem tinha ensino médio completo em 1995 ganhava 64,4% a mais do que quem tinha fundamental. Essa distância baixou para 41% em 2012 e para 19,1% em 2017.

A recessão obrigou a contadora Hortência Anastácia a trocar a filha Anna Letícia, de 12 anos, de uma escola particular para uma pública. O marido, engenheiro e também contador, perdeu o emprego. Vindo de escola pública e com a filha mais velha e o enteado também na rede bancada pelo Estado, Hortência vê o ensino público como um direito a ser defendido:

— A escola pública é essencial, como diz a Constituição. É obrigação do Estado e, se ele não oferecer, muita gente, como eu, não teria como colocar os filhos na escola. No país com uma situação econômica tão difícil, com tanta gente lutando para pagar aluguel, comida, como ficaríamos sem escola pública? Ela é a base para que a sociedade fique melhor.

O gargalo ainda está nas universidades. Nessa etapa da escolaridade, Soares constatou que o ensino superior gratuito aumenta a desigualdade, por ser “um benefício massivo para a metade superior da distribuição de renda e um dos componentes mais regressivos (menos distributivos) da renda familiar”.

A faculdade é restrita no Brasil. Os ganhos dos trabalhadores que têm esse nível de instrução mostram isso. São 180% superiores aos que conseguiram concluir o ensino médio, se mantendo nesse patamar desde 2012, mostram os estudos de Naércio Menezes Filho.

Rafael Georges, coordenador de campanhas da Oxfam Brasil, ONG que lançou semana passada relatório sobre o tamanho do fosso social no Brasil, afirma que os gastos sociais são tão importantes para a redução da desigualdade quanto os programas sociais.

— Temos dois desafios importantes nessa área: reduzir a evasão escolar, principalmente no ensino médio, e aumentar o acesso à universidade.

Segundo o relatório “A distância que nos une”, da Oxfam, apenas 34,6% dos jovens de 18 a 24 anos estão matriculados no ensino superior, e a parcela total dos que efetivamente o concluem é de apenas 18%. Nos países desenvolvidos, a taxa de conclusão é de 36%. Até mesmo nos países em desenvolvimento, como Turquia e China, a parcela da população que conseguiu terminar a faculdade é de 31% e 22%, respectivamente, diz o relatório.

Publicado em O Globo

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5 Comentários

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Excelente abordagem e este assunto deveria ser pauta permanente nas redes sociais.Temos um déficit enorme nas desigualdade por falta de oportunidade e vou aém deveria ser fiscalizada como acontece na Frnaça.Um amigo meu que é Capitão de Corveta, foi passar uns dias com sua família na França e seus filhos estavam no paseio da casa e foi abordado por políciais franceses perguntando o porque as crianças não estavam na escola .Explicou que estava de férias e morava no Brasil.Deveria ser obrigação e criar um projeto de lei onde os pais seria responsável pela continuidade da educação dos filhos.Acabar com a bolsa e subsidiar escolas em tempo integral permanente. continuar lendo

E da onde é que tiraram que o problema é a desigualdade?
Quer acabar com ela? é muito simples, dê a posse de todas as propriedades ao governo e pronto, teremos uma igualdade material e social instantânea.

"O economista usou as notas da Prova Brasil e do Enem para atribuir valor à escola pública. Encontrou alunos da rede pública que tinham as mesmas notas de alunos da rede privada e verificou quanto era a mensalidade nas escolas particulares correspondentes às notas dos alunos."

Que bizarrice. O economista encontrou UMA variável entre 2 pessoas e utilizou-a como condição necessária para sustentar a sua tese. No minimo, bizarro.

O mais engraçado é o exemplo dado da Hortencia, logo em seguida.
Quer dizer, ela ficou desempregada por conta das medidas catastróficas do governo, mas em contrapartida ele lhe ofereceu o mínimo do mínimo e ela achou excelente.
É notável como aquela velha máxima perdura até hoje. O governo te corta as pernas, mas te dá uma muleta enferrujada e você fica extremamente contente, bizarro. continuar lendo

Só que Bolsa Família equivale à dentadura na troca pelo voto.

Já a educação pública de qualidade formará eleitores melhores que não votariam em boa parte dos políticos atuais e dos pretensos candidatos.

Com educação de qualidade acabaríamos com as políticas populistas do sistema de cotas e dos benefícios sociais como sustento (sem o compromisso de criação de empregos). O populismo iria pro brejo.

Nenhum país de primeiro mundo conseguiu chegar lá sem uma reforma educacional. Não basta saber ler e escrever, como querem os defensores do analfabetismo funcional que serve apenas de estatísticas para propagandas eleitorais enganosas. continuar lendo

O maior problema é que não existe escola gratuita, infelizmente o cidadão paga caro por uma péssima escola toda vez que vai ao mercadinho comprar 1kg de feijão. continuar lendo